A MINERAÇÃO MINEIRA E SEUS CAMINHOS
“Olha
a volta do rio
virou a vida
a água da fonte
nossa tristeza
o sol no horizonte
uma ferida
olha
o ouro da mina
virou veneno
o sangue na terra
virou brinquedo
e aquela criança
ali sentada”
(Milton Nascimento/ Nelson Ângelo)
Com esse blog espero poder desenvolver um espaço de reflexão sobre problemas que dizem respeito ao continente latino-americano e, principalmente, ao Brasil. Quero trazer à tona pensadores e revolucionários que atuaram em nossa realidade social, e que construíram instrumentos próprios para pensar e intervir na realidade latino-americana. Sendo assim, como temática do primeiro texto a ser vinculado nesse espaço, escolhi algo que há muito me preocupa e toma conta de minhas inquietações, a mineração.
Primeiramente, quero deixar bem claro que não defendo uma inversão do desenvolvimento humano, que nos leve ao fim de todo desenvolvimento tecnológico, nos retornando a um comunismo primitivo como o existente em algumas sociedades indígenas. Também não sou ambientalista e muito menos pacifista, e não vejo soluções para as questões do super aquecimento global na tentativa de se criar um “Capitalismo mais humano e menos selvagem”, os limites do capitalismo são dados pelo capital, isso é, pela acumulação, pelo lucro e pela exploração do trabalho, e não é possível conciliar uma limitação dos lucros e o fim da depredação ambiental (que acontece, principalmente, nos países subdesenvolvidos) ao capital. Para isso seria preciso buscar outro tipo de sociedade.
Mas podemos ocupar alguns espaços no Estado abertos pela correlação de forças inerentes a ele, mesmo que estejamos no lado fraco. Não podemos, simplesmente, desclassificar o Estado como comitê de organização dos interesses das classes dominantes, caindo na “doença infantil de esquerda”, classificada por Lênin. Podemos nos apoderar de algumas brechas para fazer valer algumas poucas, é verdade, de nossas reivindicações.
Também devo precisar que o caminho apontado aqui, se é que aponto para algum lugar, não é o ideal. Aqui levo em conta a atual retração dos movimentos de esquerda e de suas lutas e a realidade local das regiões envolvidas com a exportação de commodities, e assim, penso em algo parecido com um caminho desenvolvimentista. É algo triste, mas faz parte de um realismo conjuntural que, espero, não será eternamente o sul de nossos pensamentos.
A região de Minas Gerais, historicamente, é conhecida por sua indústria extrativa relacionada à mineração. A relação da região com esses recursos naturais está ligada a exportação desde fins do século XVII, exportando riquezas, trabalho social acumulado e mais-valia, e deixando a decadência. Desse período não restaram muito mais que buracos e cidades que marcaram a ostentação de outros tempos. Podemos notar que a história vem se repetindo como tragédia.
A mineração rendera poucos empregos, era baseada no trabalho escravo, não desenvolveu o mercado interno, já que era uma atividade essencialmente exportadora, e deixou como herança a destruição do homem e da natureza. O ouro não engendrou segmentos produtivos in loco, pois muito se gastava na importação de gêneros de subsistência e quase nada se produzia dentro das Minas, não ocorrendo, também, a retenção do excedente produzido.
Hoje em dia o setor da mineração ocupa 30% do PIB de Minas Gerais. Mas a produção destas riquezas na região jamais foi sinônimo de desenvolvimento social, muito pelo contrário, os municípios mineradores apresentam baixíssimos níveis de IDH. Dos municípios mineradores, apenas Araxá e Nova Lima apresentavam IDH de cidade desenvolvida. Já as outras, apesar das incomensuráveis riquezas produzidas, têm IDH abaixo do necessário: Itabira, Mariana, Brumadinho, Ouro Preto, Itabirito, Congonhas, Barão de Cocais, Santa Bárbara, Paracatu são alguns desses municípios.
Os problemas causados pelas mineradoras são muitos e evidentes, tanto economicamente, socialmente e ambientalmente. A depauperação da Serra do Curral pela mineradora estatal MBR, localizada na região sul de Belo Horizonte, rendeu a primeira CPI da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, em 1975. A extenuação da Serra já causou o desequilíbrio ambiental e problemas aos habitantes vizinhos. Mais recentemente, o rompimento da represa de dejetos da mineradora Rio Pomba, localizada a 335 km a sudeste de Belo Horizonte, poluiu rios, causou problemas de saúde na população mais pobre em várias cidades, inclusive no estado do Rio de Janeiro..
A exploração dos minérios de Minas Gerais já financiou desde o império inglês e sua revolução industrial, até as grandes multinacionais do minério de hoje, trazendo inúmeros prejuízos aos que deveriam ser os maiores agraciados, os moradores das zonas mineradoras. Esses recursos naturais são finitos e sua comercialização deve ser utilizada para o desenvolvimento local. Com o discurso aparente do desenvolvimento, as multinacionais dilapidam socialmente e ambientalmente as Minas, transferindo para o exterior excedentes e matérias-primas que poderiam ser revertidos para o desenvolvimento da região. Recorro aqui à teoria desenvolvida pelo sociólogo mineiro Ruy Mauro Marini, chamada “Teoria da Dependência”. Esse grande pensador vem sendo resgatado, pois havia sido relegado a um papel secundário por FHC e seus comparsas do CEBRAP. Dentro dessa visão, o capital externo não representa uma poupança externa que se integra às economias latino-americanas, mas antes busca lucros e excedentes que são direcionados aos seus centros de acumulação, situados fora da região. O resultado a médio e longo prazo é a sangria de divisas dos países da região que se saldava com a superexploração do trabalhador, assim a burguesia nacional retinha um pouco para si do excedente extraído do trabalho.
Então qual caminho deveríamos buscar? Acabar com a mineração? Provavelmente não, pois essa é uma via que deve ser perseguida caso houvesse um movimento mais amplo de questionamento do capitalismo, como não é o que vem acontecendo, nos resta uma opção, reter um pedaço maior dos lucros das grandes empresas. Esse é um caminho que vem sendo tomado por vários dos governos da América Latina, como Paraguay com Itaipu, Venezuela e Equador com o petróleo e a Bolívia com os hidrocarbonetos. Na Bolívia, a taxação dos lucros das multinacionais, após o governo Morales, passou de em torno de 15% para 50%, fundos que serão direcionados aos inúmeros programas sociais criados por lá recentemente. No Brasil, segundo a Constituição, as mineradoras devem pagar royalties (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais- CFEM) sobre a venda de minérios, sendo 3% para a bauxita, potássio e manganês; 2% para o minério de ferro, caulin, cobre, níquel e fertilizantes e 1% ouro. Em 2005, a arrecadação de CFEM foi de R$406.047.604,00 representando 1,3% do total produzido, R$31.467.021.146,00. As mineradoras ganham rios de dinheiro e retribuem os Estados e municípios com uma quantia ínfima que sequer cobre os gastos com meio ambiente. São números ridículos!
A mineração não deve se ater apenas à criação de empregos, pois esta é uma atividade finita, por isso deve ser direcionada por um pensamento que leve em conta efeitos a longo prazo. Além do que a mineração não envolve grande emprego de mão de obra. Segundo o Anuário Mineral Brasileiro, do DNPM, em 2005, toda a mão-de-obra direta, utilizada na mineração era de 128.131 pessoas, sendo 103.262 empregados das mineradoras, 21.655 das terceiras e 3.214 cooperativados. As mineradoras aproveitam a pobreza das regiões envolvidas com mineração, que tem essa como sua única atividade econômica, para diminuir salários, e ainda, ameaçando mudar-se para outras localidades.
O assunto vai muito além desse meu papinho furado, tomando o tempo, e atividade, de inúmeros intelectuais ao longo dos tempos.
Mas enfim, a miséria fica, as pedras vão, e junto com elas nossas chances de engendrar o início de nosso dever histórico, de acabar com a miséria e a fome do país.
Comentários
Obrigado
Pra finalizar (e agora uma opinião mais critica) é muito facil e comodo deixar uma multinacional entrar no país na hora q precisa, qdo há necessidade de arrecadar mais dinheiro ou exportar mais. Só q depois q essa empresa se estabelece e cria vários empregos, desenvolve a região, o país e o povo resolve achar q estao sendo explorados e pretendem nacionalizar pagando muito menos q a empresa vale. Aí não dá né Alberto!!!
Ao Fabrício:
Desculpem-me a demora, estive muito ocupado no estudo para um concurso no qual não vou passar. Em primeiro lugar, gostaria de deixar claro que, como os compadres disseram, esse é um espaço de debates, de exposição e desenvolvimento de pensamentos, por isso os comentários não devem ser, necessariamente, perguntas dirigidas a mim, como se eu fosse o detentor do conhecimento. Claro que se sintam à vontade para me questionar sobre os textos, mas podem fazer também observações, complementos e afirmações.
Quanto ao comentário do Fabrício quero fazer, pode-se dizer, algumas retificações em relação à parte final.
Primeiramente não existe uma relação automática entre instalação de multinacionais e desenvolvimento social, do contrário Haiti, Bolívia, a África em geral, e outros países pobres, seriam grandes potências, visto que são verdadeiros celeiros das multinacionais. Na verdade estas prejudicam muito mais do que ajudam. As multinacionais monopolizam o mercado impedindo a nascente indústria nacional dos países pobres de se desenvolver. Não amplia a indústria de alto valor, e sim a de commodities. E não sei a quais processos de nacionalização você se refere, visto que houve, nos recentes acontecidos na América do Sul, indenizações com os preços estipulados pelas próprias multinacionais, algo que discordo plenamente visto que os lucros das multinacionais já pagaram milhões de vezes seus custos ou qualquer outro tipo de prejuízo que venham a ter nesses processos.
As multinacionais não estão preocupadas com o desenvolvimento social, e sim com o lucro. E seu histórico como agente imperialista é longo na América Latina e no mundo. Já sabotaram inúmeras vezes a indústria nacional dos países pobres, derrubaram governos democraticamente eleitos, empossaram outros governos ditatoriais, assassinaram e roubaram. Pra alguns exemplos disso vide alguns dos documentários abaixo, mas os exemplos são muitos e acontecem todos os dias, claro, sem qualquer tipo de cobertura pela mídia dominante, mas você pode se informar por alguns tipos de mídia alternativa e confiável, como essa: http://www.midiaindependente.org/
E é exatamente pelo dito acima que devemos tentar barganhar pedaços maiores dos lucros para investirmos em conhecimento e formarmos nossa própria produção, incentivando inclusive a formação do mercado interno.
Aqui vão algumas sugestões de documentários e filmes mais superficiais sobre o assunto, que já é algo bem estudado, por isso, caso haja interesse, posso indicar alguma literatura.
Documentários:
http://br.youtube.com/watch?v=hj-5iFrVczQ
http://br.youtube.com/watch?v=r74hghKB2ls
Filmes da recente onda de “preocupação” hipócrita hollywoodiana frente à atuação de multinacionais nos países pobres:
http://br.youtube.com/watch?v=ziUZE5Hygso
http://br.youtube.com/watch?v=H8w_OzDFTjc
“Jardineiro Fiel”