ANÁLISE DO DISCURSO DA VALE




Dando continuidade à análise dos diferentes discursos sobre a mineração publico o discurso hegemônico, ou seja, o da Vale. Mais especificamente, tomei como assunto a ser discutido a implantação do Projeto Apolo.

A) O Projeto Apolo:

O projeto Apolo é um projeto de extração de minério de ferro da Vale a ser instalado na Serra da Gandarela, que abarca os municípios de Caetés, Rio Acima, Raposos, Santa Bárbara, Itabirito e Barão de Cocais. A represa de rejeitos será instalada em Raposos. Isso potencialmente, pois o projeto se encontra na primeira fase para aprovação, chamada licença prévia. Vêm sendo realizadas uma série de audiências públicas na região, inclusive em Raposos. Já o Projeto Manuelzão se opõe à instalação da mineradora na região, querendo criar o Parque Nacional da Serra da Gandarela, o que impossibilitaria a instalação da mineradora na serra.

B) Análise do discurso da Vale:

O material que serviu como base para a análise foi conseguido de duas formas: a) no site oficial da Vale; b) material enviado a mim por e-mail pelo pessoal da Fundação Vale.
O segundo caso serviu como base para a análise, e o primeiro tipo de material, vez por outra, ampara o material principal. Para conseguir tal material, fui à sede da Vale no Rio de Janeiro. Lá, após algumas conversas, me dirigiram à Fundação Vale, onde conversei com um de seus atendentes. Me apresentei como pesquisador da UERJ que estava interessado em material que disserte sobre benefícios sociais trazidos às comunidades locais das regiões mineradoras, e mais especificamente em relação ao Projeto Apolo. De cara, me foi dito que haviam apenas dois parágrafos escritos sobre supostos benefícios sociais do Projeto Apolo, o que demonstra a pouca, ou nenhuma, importância do assunto para a Vale. Respondi que tentasse fazer algo como uma bricolage com outros materiais próximos do tema. Por isso, agradeço ao atendente Marlon pela atenção e pelas duas páginas A-4 enviados ao meu e-mail. Ao que interessa.
O e-mail enviado a mim consiste numa rápida definição do que é o Projeto Apolo, além de outras duas notícias a respeito de investimentos da Vale para formação de mão de obra e criação de empregos na região. Começa assim:

O Projeto Mina Apolo constitui-se em uma mina de minério de ferro, em área localizada do Quadrilátero Ferrífero, em Minas Gerais. O empreendimento consiste na abertura de mina e na implantação dos componentes necessários para as operações. Isso inclui usina de beneficiamento, oficinas, barragem de rejeito, pilhas de estéril, pátio de produtos e escritórios, entre outras instalações. O início das operações está previsto para o final de 2013.A capacidade de produção anual será de 24 milhões de toneladas (Mt), sendo 16Mt de Sinter Feed e 8Mt de Pellet Feed (67% e 33% respectivamente). Esse minério será transportado até os clientes pelo sistema logístico da Vale. Para isso, será construído um novo ramal ferroviário com cerca de 20 km, que será ligado à Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM).

Primeiramente, quero destacar que pedi material sobre possíveis benefícios sociais à população local. A relação feita é de que a capacidade de produção anual, “usina de beneficiamento, oficinas, barragem de rejeito, pilhas de estéril, pátio de produtos e escritórios”, são sinônimos de benefícios sociais. Entendemos por benefícios sociais o combate à pobreza e miséria, a diminuição da desigualdade social.
A mineração não combate a desigualdade social. A concentração regional de renda fica evidente quando sabemos que 80% da arrecadação com a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem) vai para 40 municípios dos 360 municípios mineradores do estado (JORNAL).
A produção destas riquezas na região jamais foi sinônimo de desenvolvimento humano, muito pelo contrário, os municípios mineradores apresentam baixos níveis de IDH. Dos municípios mineradores, apenas Araxá e Nova Lima apresentavam IDH de cidade desenvolvida. Já outras, apesar das incomensuráveis riquezas produzidas, tinham IDH abaixo da média: Itabira, Mariana, Brumadinho, Ouro Preto, Itabirito, Congonhas, Barão de Cocais, Santa Bárbara, Paracatu, todos esses municípios em Minas Gerais (GODEIRO, 2007, p. 44).
Assim como no e-mail, em seu site, o discurso da Vale não leva em conta o fato de que o Projeto deve passar por licenciação legal, já marcando a data de início do projeto, mostrando em seu discurso a certeza da instalação da mina, rejeitando a possibilidade de não aceitação do projeto. Não há qualquer menção sobre o projeto se encontrar em meio a um conflito de interesses na região. Isso constitui uma subestimação das iniciativas contrárias ao projeto, ou quem sabe, uma atitude realista, visto que a hegemonia atingida pelos grupos mineradores na região pode garantir a consecução de seus interesses.
Algo bastante sublinhado no site da Vale e em outros sites de notícias é a criação de empregos. Serão 2 mil empregos durante a fase de instalação da mina e, desses, mantidos mil empregos quando em funcionamento. O setor da mineração ocupa, hoje, 30% do PIB de Minas Gerais. A mineração responde por cerca de 10% do PIB brasileiro, o que responde a R$150 bilhões por ano (GODEIRO, 2007). No entanto, a mineração é uma das atividades econômicas que menos criam empregos. De acordo com levantamento da Fundação João Pinheiro, em fevereiro de 2010 os empregos diretos da atividade mineradora correspondiam à apenas 1,9% do total de empregos de Minas Gerais.
Em questão de tributos os benefícios ao município minerador são irrisórios. Segundo a Constituição brasileira, as mineradoras devem pagar royalties (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais- CFEM) descontados em seu lucro líquido, sendo 3% para a bauxita, potássio e manganês; 2% para o minério de ferro, caulim, cobre, níquel e fertilizantes e 1% ouro. Em 2005, a arrecadação de CFEM foi de R$406.047.604,00 representando 1,3% do total, R$31.467.021.146,00. Este imposto é distribuído em 12% para a União, 23% para Estados e 65% para os municípios. Minas Gerais ficou com 50,1%. As mineradoras ganham rios de dinheiro e retribuem os Estados e municípios com uma quantia ínfima que sequer cobre os gastos com o meio ambiente. E isso quando as mineradoras pagam a Cfem. Em 2005, a DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral) realizou uma vistoria nas contas da CSN, MBR, Samarco e Vale, e constatou que, desde 1991, não haviam pago cerca de dois bilhões de reais a título de Cfem.
Destaco a alta incidência nas propagandas da Vale de números absolutos quando argumentam sobre investimentos, sem especificar em que será investido e em benefício de quem ou qual classe. No Projeto Apolo, serão R$ 5 bilhões em investimentos para uma produção que pode chegar aos 24 milhões de toneladas de minério de ferro por ano. Estes números grandiosos lidam com a idéia de que uma população inteira, sem diferenciações, será beneficiada.

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