CRÍTICA À ESQUERDA CONTRA O ESQUERDISMO



Não gosto de fazer críticas contra a esquerda. Esta ampla posição política (acho que posso chamar assim), que abriga inúmeras correntes teóricas, já é por demais ofendida pela grande imprensa burguesa e seus súditos. Por isso evito publicizar minhas críticas contra a esquerda. Mas a recente cisão da esquerda no segundo turno das eleições presidenciais me coloca a necessidade de tecer uma crítica bem direcionada. Muitos se colocaram na posição do voto nulo por pensarem ser as eleições uma hipocrisia pseudo-democrática. De certo ponto de vista eles tem razão. Outros também se colocaram nesta posição e foram além. Direcionaram seus esforços retóricos contra a candidata Dilma, chegando ao ponto de nem citarem o nome do candidato Serra, ou centrar qualquer crítica contra ele. Que o PT, principalmente por causa de sua ampla base partidária, tomou como seus inúmeros dos interesses da burguesia ninguém pode negar. Porém igualar os dois lados da eleição me parece uma atitude infantil e irresponsável. E é aqui que destaco esse grupo político que classifica, simplesmente, ambos candidatos como “burgueses”, sem maiores detalhamentos ou considerações. Gostaria de taxar este grupo como esquerdista.
O esquerdismo, já foi alvo de crítica de Lênin, que o diagnosticou como “doença infantil de esquerda”. Ele é composto por políticas inconsequentes e fantasiosas que insistem em simplificar o mundo numa divisão entre bem e mal, onde só valem a pena direcionar seus esforços a ações puras do “bem”. Esse tipo de ação relega os valiosos espaços políticos, objeto de intenso conflito, aos setores mais tacanhos e oligárquicos da sociedade, mais ou menos da forma que os esquerdistas brasileiros tentaram fazer nesse segundo turno, quase numa teoria do quanto pior, melhor.
Esse esquerdismo, doença infantil, recorre sempre a uma frasismo raso que reflete suas concepções de mundo. Se melhor desenvolvidas, estas frases poderiam mostrar uma profunda visão de mundo que se aproxima do real, mas em geral, são sempre resumidas, e ao invés de atrair as classes populares para o terreno da esquerda tem o efeito reverso. Acabam por “bobificar” e estereotipar a esquerda, afastando, assim, as classes populares do campo político da esquerda. Tudo se torna culpa do “sistema” ou do “imperialismo”. Dentro desse raciocínio simplificador, igualam dois grupos políticos, PT e PSDB, que têm importantes diferenças entre si. E pela atuação de alguns esquerdistas quase fui levado a acreditar que eles defendiam a vitória de José Serra.
O esquerdismo quer adequar o mundo à sua visão, e não buscar atingir uma relação dialética entre ambos que transforme a atual realidade. O compromisso deles é com eles mesmos, numa busca transloucada para mostrar que são eles os detentores do conhecimento supremo e são eles que tem a posse da razão.
Contra esse tipo de irrealismo Marx e Engels teceram crítica no Manifesto, quando falavam sobre os socialismos utópicos: “belas e nobres propostas, porém instavelmente assentadas sobre falsos diagnósticos que davam luz a projetos ainda mais errôneos de transformação social”.
Devo lembrar a mim mesmo que meu compromisso é com as classes populares, e não com Marx, Engels ou Lênin. Na verdade, me utilizo dos grandes estudos desses pensadores porque eles também não eram à favor de si próprios, mas das classes populares. Meu objetivo não é adequar o mundo ao marxismo, mas me utilizar do marxismo para melhorar as condições sociais de nossa gente. Existe um erro de enfoque. Desde a infância, o que nos comove e nos posiciona como esquerda é a luta contra as misérias humanas, e não a luta para impôr uma visão de mundo esquerdista. Esse mesmo esquerdismo foi que deturpou o marxismo em versões grotescas stalinistas e economicistas. Acho que o campo teórico da esquerda serve para lutar contra essas misérias humanas, e caso um dia ele se torne um monolito inútil nessa empreitada o abandonarei sem o menor remorso. Como isso não irá acontecer tão cedo, me filio ao campo da esquerda. Mas de uma esquerda responsável que saiba se posicionar dentro do campo político e, acima de tudo, com compromisso popular. É agora que nós da esquerda devemos direcionar nossas críticas contra o atual governo, já que o pior dos males foi evitado.

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