O ROYALTY DA MINERAÇÃO E A CAMPANHA “MINÉRIO COM MAIS JUSTIÇA”



Liderada pelo senador Aécio Neves e pelo governador de Minas Gerais, Antônio Anastasia, foi lançada no dia 25 de junho, em Belo Horizonte, a campanha “Minério com mais justiça”, a favor do aumento do Cfem (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais) - o royalty da mineração – que na legislação atual vai de 0,2% a 3% do lucro líquido das mineradoras, de acordo com o bem mineral explorado. A intenção é chegar a 4% do lucro bruto. A iniciativa têm como principais interessados os governos do Pará e de Minas Gerais, além de ser apoiada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e pela Associação Mineira de Municípios (AMM). O que inicialmente pode nos causar estranheza é o fato dos caciques do PSDB mineiro estarem à frente dessa campanha, isso porque ambos contam com calorosas contribuições das mineradoras, leia-se Vale, para suas candidaturas. Por isso a questão merece algumas considerações.
Primeiramente, é necessário ter em vista o amplo debate sobre o royalty do petróleo que se instaurou no Brasil após o anúncio da descoberta de petróleo na camada do pré-sal. Junto a este debate ressurgiu a demanda pela reforma do marco regulatório da mineração. A necessidade dessa reforma é evidente quando, por exemplo, comparamos nossa legislação minerária com a de Canadá e Austrália, que cobram até 20% do lucro bruto. Ainda, o royalty do petróleo brasileiro chega até 10% do lucro bruto. Pela evidência e inevitabilidade desse debate, parece óbvio que os idealizadores da campanha se anteciparam a reivindicações mais radicais que poderiam exigir uma mordida ainda maior no bolso dos barões do minério de ferro, principal pauta de exportação do país já há algum tempo. O próprio Aécio Neves deu um passo atrás ao diminuir sua proposta de reforma que foi de 5% do lucro bruto para 4%, porcentagem defendida pelo senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA).
Existe a possibilidade de que a reforma embase um desenvolvimento real e justo, principalmente para os municípios mineradores. Porém, a ideia de que o aumento do royalty na mineração leva automaticamente à justiça social é equivocada. Sendo a única pauta da reforma, ela leva a uma gigantesca elevação da caixa das prefeituras que pode esvair-se com políticas vazias, reforçando a dependência dos municípios pela mineração e servindo apenas aos interesses das oligarquias locais. Tendo como marco de reflexão o Seminário “Governança dos Recursos Naturais na América Latina e Caribe”, realizado pela Cepal, podemos dizer que, de forma bem resumida, a reforma deve incluir em suas pautas centrais:

  • A criação de um Fundo Social Nacional destinado a financiar investimentos em ciência e tecnologia.
  • A criação de um fundo de poupança e estabilização para respaldar medidas anticíclicas, pois a volatilidade dos preços das commodities é historicamente comprovada.
  • Em nível municipal, por meio de um Fundo Social Municipal, incentivaria-se a diversificação da estrutura econômica local com objetivo de, em médio prazo, escapar à dependência pela mineração, tendo em vista seus vários impactos negativos.
  • Incentivos fiscais e estruturais para o desenvolvimento do setor industrial agregando valor à mercadoria, incentivando a retenção de capital.
  • Aliado a isso, os governos municipal, federal e estadual, também através do Fundo Social, ampliam e melhoram as políticas sociais.
Tais medidas acarretarão um impacto gigantesco principalmente nos municípios mineradores. O objetivo central da reforma do marco regulatório da mineração deve ser a transformação produtiva dos municípios mineradores, possibilitando novas formas de produção com menores impactos ambientais e sócio-econômicos.
No entanto, a proposta de reforma é muito menos ambiciosa do que os pontos expostos acima, apesar de incluir alguns deles de maneira diversa. Obviamente, a proposta conflita com o interesse das mineradoras, mas é ao mesmo tempo aceitável pelo temor de uma reforma ainda mais profunda. Penso que taticamente devemos apoiar essa iniciativa. A inexistência ou fraca propagação de uma proposta mais ampla justifica o nosso apoio. Porém, por seus rígidos limites, pela timidez de suas reivindicações e pela companhia dos PDSBistas, é necessário que nosso apoio seja prioritariamente crítico e temporário. Em nossa compreensão, a necessidade da reforma do marco regulatório da mineração não é contraditória à nossa principal pauta: o fim da mineração. A própria renda retida pelo royalty deve servir para que nos emancipemos da mineração em busca de novos modelos produtivos.

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