AO TEMPO- HOMENAGEM AOS HERÓIS































Começo a escrever esse texto com profundo pesar, algo próximo a uma angústia, um medo de esquecer o que deve ser lembrado. Tenho vivido ultimamente com a sensação da proximidade da morte e do fim dos sonhos, mas não com a minha morte, e sim a de uma geração. Sentimento em grande parte motivado pelo definhamento e fim próximo de uma geração. Devo dizer, primeiramente, que este não é um sentimento motivado pela morte do astro Pop Michael Jackson. Devo dizer isto visto a grande comoção mundial com o ocorrido. Por falar nisto, não concordo com o sensacionalismo, ou shownalismo, que vem sendo abrangida a morte do dito artista. Mas este é assunto para um outro texto. Na verdade, esta é uma dor que venho sentindo há tempos e que sempre aflora ao notar que o tempo está passando. Escrevo esse texto mais por desabafo do que pelo intuito de escrever algo interessante para o leitor.
Alguns diriam que, após a leviandade da juventude, venho tomando consciência da transitoriedade da vida. Mas é muito mais que isso, é a percepção, e intuição, de que a História foi feita e estamos nos despedindo de uma geração marcante que será lembrada pelo resto da vivência humana. É a geração de nossos pais, caso você tenha pais nascidos nos anos 40s e 50s, ou, como dizem, geração pós-Segunda Guerra Mundial. Períodos como esse são totalmente específicos na história humana. São compostos por uma confluência de aspectos que levam a formação de auges históricos que acontecem raras vezes. Os anos 60s, 70s distinguiram uma geração que tinha como ideal o “impossível”.
Eric Hobsbawn, muito sabiamente, soube captar esse “Espírito do Tempo” e taxou o século passado de “Era dos Extremos”. Isso principalmente pelos anos 60s e 70s. É uma geração de extremos, de radicalismos, sem espaço para diplomacias e médias. Tentou transformar o mundo em algo melhor de uma vez pra outra. E realmente nunca se passou tão perto disso. Quem sabe, também, nunca mais se passará. Ao mesmo tempo em que é extremamente trágica, visto que resultou no mundo de desilusões e do “fim da história” (o que não passa de besteirol capitalista, visto que a História é constante transformação). O desengano é a marca atual dessa geração, o fracasso recente dos projetos coletivos é a grande razão. As ditaduras na América Latina, a concentração de renda como nunca se viu antes, os regimes assassinos “pseudo-socialistas” na Ásia e Leste Europeu e o neoliberalismo foram as marcas do outro extremo, o oposto da utopia. Uma geração que sonhou com o máximo e terminou no fim das utopias. Mas é aí que se encontra a beleza dessa geração, a coragem para sonhar, a transposição dos obstáculos impostos pelo conformismo e pelo medo, e a luta apaixonada pela transformação de um mudo profundamente injusto. Os anos 60s e 70s são o contexto desse apogeu cultural e intelectual. Nunca se produziu tantos gênios em tantas áreas ao mesmo tempo. Indivíduos, revoluções, grupos, teorias, poetas, artistas, líderes, cientistas, escritores, objetivos que serão lembrados por muito tempo. Mas aqui é que se encontra o meu medo, o do esquecimento. De jogarmos ao ostracismo e ao esquecimento uma época histórica que tanto tem para ensinar.
E sobramos nós, a realidade, uma geração boçal, marcada pela fragmentação do sujeito social, pós-moderna como dizem alguns, individualista, sem projetos coletivos, a geração das raves, das cocas e marcas, da aparência e egoísmo, da superficialidade, alheia aos problemas profundos do mundo, que se “deixa levar”, que acredita no “destino” e não na ação humana, que vive o momento sem projetos de longo prazo, e acima de tudo, dominada pelo consumismo. Contornos de um mundo que valora mais o valor econômico que o humano. Sinceramente, uma geração a ser esquecida.
Na mitologia grega Chronos representa o tempo. Seus filhos tinham um destino do qual não podiam escapar, eram devorados pelo pai. Assim nenhum de nós pode fugir desse ser maravilhoso e perverso, o tempo. Maravilhoso por nos deixar passar uma estação nessa miscelânea de belezas e feiúras que é a vida, e perverso por nos mastigar vagarosamente, até nos engolir. Isso é o que mais me dói, ver o lento passar e despedir dessa geração. Sou testemunha da História.
Mas como escreveu Érico Veríssimo em “O Tempo e o Vento”: "Uma geração vai, e outra geração vem; porém a terra para sempre permanece”.
Torço para que Guimarães Rosa tenha razão: ”as pessoas não morrem, elas ficam encantadas”.

Comentários

Tádzio Coelho disse…
Obrigado cumpadre! Esteja à vontade para comentar.
Unknown disse…
Talvez não tenha surgido, mas foi exteriorizado no show do Milton com certeza.

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