FERRO MORTO

“Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?”.

Fazer o quê? Como voltar para o sertão de onde saí, se ele já não existe? Será que ainda estou lá, andando por entre montanhas e sorrisos? Nas serras de terra vermelha, minha alma ferrosa se contorce como capim em queimada, estala em labaredas de fogo.
O peso do passado aumenta à cada dia e massacra essa alma, envelhecida de tanto caminhar.
Ela se mantém suja de poeira, verdade verdadeira.
Como escapar à minha condição?
Busquei desde o mais tenro momento a solidão, e ela me espreitou em cantos escuros, em vazios momentos, e agora que a encontrei compreendo meu mal necessário.
Pelas noites longas, tento afastar meus pensamentos em bares. O trabalho me faz esquecer minha condição, mas o pouco de reflexão que me permito já devasta meu coração.

“Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração”.

Na vastidão de meu coração brota uma folhagem já-seca, já-morta. E não há nada que eu possa fazer, a não ser enganar a mim mesmo.
Onde está minha Ponta de Areia? Minha chegada ao mar, onde?
Porém, realmente a chave está na minha mão e ainda não descobri se existe a porta. Hei de descobrir!

Comentários

Abaporu disse…
A chave está na sua mão, mas ainda não descobriu se existe porta...

Se você descobrisse,
Se você chegasse.

Místico.
E muito reflexivo esse pensamento, que também é sentimento.
E o mais interessante é que – de acordo com a poesia - o que melhor se aplica a esse contexto são ações subjuntivas, imperfeitas e pretéritas. Não são ações definitivas, estão conjugadas a diversas condições, demonstrando possibilidades e a inquietante necessidade de reflexão e persistência do indivíduo diante do seu próprio tempo.

E não há nada que você possa fazer, a não ser enganar a você mesmo...

E agora, Tadzio?
Se você não enganasse a si mesmo.
Tádzio Coelho disse…
É mesmo, não é definitivo, passaremos toda nossa existência nessa condição de incerteza.
Se eu não engana-se a mim mesmo?
Não sei. Quem sabe seria mais feliz, mais ousado, faria o que deve ser feito, me posicionaria junto aos justos. Uma coisa é certa, se não fossemos enganados por nós mesmos faríamos uma bagunça danada! Aliás, uma bagunça necessária.
Abaporu disse…
Entendi...
Enganar a nós mesmos:
Uma capacidade inerente ao ser humano, que em algum momento se faz necessária.

Postagens mais visitadas deste blog

OLHEM BEM AS MONTANHAS

Entrevista sobre barragens de rejeitos no Maranhão

TRISTE HORIZONTE- Carlos Drummond de Andrade